Os idealistas que fundaram algumas das companhias de tecnologia mais bem
sucedidas do mundo estão envolvidos na polêmica provocada pelo vasto
programa confidencial de vigilância do governo americano denominado
PRISM, denunciado como "orwelliano", em referência à sociedade de
controle descrita na obra de George Orwell.
A polêmica nos Estados Unidos ocorre em um momento em que outros países, especialmente a China, usam tecnologia online para espionar seus cidadãos, o que ressalta preocupações de que os governos estejam subvertendo a internet.
Ironicamente, as empresas acusadas de fazer parte deste
gigantesco Big Brother começaram com ideais nobres, como o do Facebook
de tornar o mundo "mais aberto e conectado", ou do Google de "organizar a
informação do mundo e torná-la universalmente mais acessível e útil".
"Quando as companhias ganham bilhões de dólares,
provavelmente, não são mais tão idealistas", disse Roger Kay, analista
da Endpoint Technologies Associates, que acompanha o setor desde os
primórdios da internet. "Tiveram que tomar decisões para ganhar dinheiro
ao invés de proteger os direitos dos usuários", acrescentou.
Segundo Joseph Hall, do Centro para a Democracia e a
Tecnologia (CDT, na sigla em inglês), com sede em Washington, empresas
como Google, Facebook e Apple acabaram abrigando grande quantidade de
dados para tentar "capitalizar" suas grandes bases de dados e, portanto,
se tornaram alvos importantes para as forças de ordem.
"O movimento rumo à nuvem (da internet) é
significativo", disse Hall. "Todos estes dados estão disponíveis porque
se consegue rapidamente uma grande capacidade de processamento e
armazenamento", acrescentou. Hall explicou que depois da oferta pública
de suas ações, as companhias sofrem "muita pressão para fazer coisas que
são diferentes de suas missões idealistas. Têm que criar rendimento
para os acionistas".
No âmbito do programa PRISM, revelado na semana passada,
a Agência de Segurança Nacional (NSA) dos Estados Unidos pode emitir
diretrizes a empresas da internet pedindo acesso a e-mails, fotos, chats
online, arquivos e vídeos, entre outras funções, postados na internet
por usuários estrangeiros.
Algumas das maiores empresas do Vale do Silício estão
envolvidas neste programa, entre elas Microsoft, Yahoo, Google,
Facebook, Apple, PalTalk, AOL, Skype e YouTube. Os provedores de serviço
negam ter dado ao governo acesso aos dados de seus clientes e insistem
em que só os forneceram quando obrigados por lei.
Quando as empresas crescem, "fica mais complicado"
A polêmica nos Estados Unidos ocorre em um momento em que outros países, especialmente a China, usam tecnologia online para espionar seus cidadãos, o que ressalta preocupações de que os governos estejam subvertendo a internet.
"A vigilância governamental injustificada é uma intrusão
nos direitos humanos básicos que ameaça os próprios fundamentos de uma
sociedade democrática", escreveu Tim Berners-Lee, o inventor da web, em
um comunicado publicado no jornal Financial Times.
"Peço a todos os usuários da web que solicitem mais
proteção legal e processos devidos de salvaguarda da privacidade de suas
comunicações online, inclusive seu direito de ser informado quando
alguém solicita ou armazena seus dados", acrescentou.
Lee e outros pioneiros da internet sempre viram a rede
como um meio de aumentar a liberdade pessoal. Sua Fundação World Wide
Web se dedica a "um mundo em que todas as pessoas possam utilizar a web
para se comunicar, colaborar e inovar livremente, construir pontes entre
as divisões que ameaçam nosso futuro comum".
Hall, do CTD, afirmou que "a síntese do idealismo são
duas pessoas que criam grandes serviços em suas garagens", mas quando as
empresas crescem, "fica mais complicado". Estas companhias "aparecem
muito como Big Brother, mas para sermos justos, não sabemos muito bem o
que ocorre sem termos os arquivos censurados", acrescentou.
O especialista destacou, no entanto, que "seu êxito
contínuo depende da proteção da privacidade do usuário". Ele considera
que é necessário assegurar aos clientes que seus dados estão protegidos.
Kay destacou que os clientes das gigantes da tecnologia "sempre
sentiram que podem confiar nas companhias" e que existe um risco de que
"os clientes se tornem cínicos".
Segundo Kay, muitas facetas do PRISM permanecem pouco
claras, como porque algumas companhias ficaram à margem do sistema e
porque a Apple não participou até 2012, após a morte de Steve Jobs.
"Imagino que Steve Jobs tenha dito ao governo para se
esquecer disso", afirmou Kay. Embora a tecnologia de acompanhamento
esteja disponível há muito tempo, as revelações do PRISM sugerem "uma
mudança radical".
"Apesar de isto estar acontecendo há muito tempo, o
mundo da 'consciência da informação total' já está entre nós e chegou de
forma bastante repentina", afirmou.
Fonte: Terra
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